domingo, 18 de agosto de 2013

SÓ SE DESILUDE QUEM SE ILUDIU

O leitor lembra-se de, há um ano, Pedro Passos Coelho ter afirmado no Algarve que o essencial da crise e da austeridade tinha passado? Só se iludiu quem quis, pois a realidade objectiva e subjectiva, como diria o próprio primeiro-ministro nos seus tempos de militância comunista, demonstrava o contrário. Logo a seguir, a TSU e o OGE para  o ano em curso, que passados poucos meses era um documento sem valor, falso como  tudo o que o líder do partido neo-liberal sediado na S. Caetano à Lapa e do actual governo havia dito desde a campanha que o conduziu a S. Bento, foram as primeiras decisões comprovativas de que Passos Coelho não passava de um ilusionista.
Lembra-se ainda, amigo leitor, que aquando da remodelação governamental efectuada há poucas semanas, o primeiro-ministro e seus ajudantes, especialmente Pires de Lima, enchiam a boca com o "novo ciclo caracterizado pelo crescimento"? Pouco tempo depois, no passado dia 16, novamente na "rentré" algarvia do PSD, Passos Coelho não falou de qualquer política virada para  o crescimento económico e o emprego. Pelo contrário, o seu discurso marca uma linha de continuidade (leia-se de mais austeridade e empobrecimento). Nada mudou relativamente ao tempo de Vitor Gaspar.
Após tanta mentira do primeiro-ministro, do PSD e do CDS, já ninguém se pode desiludir, pois já anteriormente não havia qualquer motivo para ilusões.
Este discurso prova também que o crescimento verificado no segundo trimestre relativamente aos primeiros 3 meses deste ano é meramente conjuntural, tendo, aliás, a economia decrescido 2% em  comparação com igual período do ano de 2012. Igualmente conjuntural é a descida do desemprego no mesmo trimestre, pois tal apenas se verificou em trabalhos muito mal pagos - nos outros o emprego diminuiu - e porque estava a chegar o Verão, quando se criam postos de trabalho apenas para esta época.
Num momento de crise como o que vivemos estamos a ser governados por ilusionistas de feira !

terça-feira, 13 de agosto de 2013

APRENDER COM GUERRA JUNQUEIRO

 
Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso da alma nacional, reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta. (...)
Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira a falsificação, da violência ao roubo, donde provem que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro. Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pela abdicação unânime do País.
A justiça ao arbítrio da Política, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas.
Dois partidos sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes, vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se malgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar. 



PUBLICADO NO BLOGUE "ABRUPTO", DE PACHECO PEREIRA, NO DIA DE HOJE.

NOTA: QUALQUER SEMELHANÇA COM A REALIDADE POLÍTICA ACTUAL NÃO É MERA COINCIDÊNCIA.

sábado, 10 de agosto de 2013

O INTELECTUAL MISTIFICADOR

O intelectual orgânico deste governo, Miguel Poiares Maduro, mostra-se cada vez mais, à semelhança dos intelectuais daquela estirpe, especialmente os serventuários de ditaduras, um mistificador.
Veio dizer que a quebra no desemprego é  sinal de que "estamos a melhorar".
A verdade é esta: aquela quebra deve-se ao efeito sazonal do Verão e apenas se verifica em empregos com baixos salários, pois nos trabalhos melhor pagos o desemprego continua a aumentar. É o INE quem o diz.
E no tocante à dívida pública, ao défice, ao número de pessoas a recorrer ao Banco Alimentar e a instituições particulares de solidariedade social para se alimentarem e vestirem, estamos melhor, Prof. Maduro?
Com a ida de  Miguel Poiares Maduro para o governo talvez se tenha perdido um brilhante intelectual e analista, que certamente deixará de ter o mesmo respeito dos seus pares, e ganhou-se um mau político. É o que acontece quando os intelectuais perdem a independência de pensamento e de espírito  e se tornam em propagandistas do poder, quase sempre - é este o caso - mais papistas que o Papa.

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

ECONOMIA OU SOCIEDADE DE MERCADO ?

                           
Há muitos anos, quando era director do jornal "Expresso", José António Saraiva qualificou, naquele semanário, Proença de Carvalho, Vitor Cunha Rego e Maria Elisa Domingues, como defensores de um liberalismo económico selvagem. Não tinha razão, pois todos eles, no que diziam e escreviam, mostravam preocupações sociais e a defesa da ascenção social dos mais pobres.
Passado todo este tempo, José António Saraiva é director do semanário "Sol", ao serviço da cleptocracia angolana e porta-voz das posições do governo Portas-Passos. A ideologia, falhada em todo o mundo e também no nosso país, que serve de base a esse governo, é o neo-liberalismo, herdeiro de Ronald Reagan e Margareth Thatcher. Saraiva  tornou-se num dos seus maiores seguidores. Pela sua lógica de há 20 anos, é hoje um dos defensores do capitalismo selvagem. Aliás, é vê-lo elogiar a facilidade em despedir - chegou a escrever que os despedimentos deveriam ser totalmente livres, o que Paulo Portas também fez no "Independente", afirmar estar certo baixar salários e trabalhar mais, cortar nas reformas, aumentar impostos, e tudo o mais levado à prática pelos partidos ditos social-democrata e democrata-cristão, ao contrário do afirmado na campanha eleitoral de há dois anos.
Recentemente, escrevia no jornal com cheiro a sangue de angolanos e não só "vivermos numa sociedade de mercado, como defendiam o PS, o PSD e o CDS".
Nenhum daqueles partidos, nos seus programas, fala em "sociedade de mercado". Pelo contrário, falam em "economia de mercado regulada pelo Estado". Antes de estarem no actual governo, PSD e CDS afirmavam que "a solução, mesmo na economia, não estava toda no mercado". O PS, após ter abandonado o estatismo que o caracterizou em outros tempos e o próprio marxismo, passou a defender o funcionamento do mercado sob supervisão do Estado, rejeitando muito claramente a sociedade de mercado.
Se Saraiva mentiu relativamente aos programas daqueles partidos, falou verdade quanto ao funcionamento das sociedades ocidentais, onde a política está submetida à economia e os grandes grupos económicos mandam e controlam o poder político, especialmente nos países onde a nova direita liberal-conservadora, capitaneada por Angela Merkel, recentemente apelidada de falsa democrata-cristã por uma sua companheira de partido, ex- assessora do chanceler Helmut Kholl, de pouco valendo o voto popular. Ou seja, o poder económico está a destruir a democracia política e também a democracia económica, acentuando as desigualdades sociais e a exploração de mão de obra barata, em favor dos privilegiados. Recordamos, a propósito, ter o liberalismo clássico a luta contra o privilégio como ponto comum com sociais-democratas, socialistas, comunistas e anarquistas.
Por outro lado, o PSD e o CDS, apesar do que está escrito nos seus programas, têm encaminhado Portugal para uma sociedade de mercado, ao gosto do capitalismo sem alma e dos seus serventuários, como José António Saraiva. É a esta gente, apesar de desacreditada e moribunda do ponto de vista político, que vamos continuar entregues por obra e graça do Senhor Presidente da República.
               
PS: cada vez mais este PSD se afasta da verdadeira social-democracia. O partido mais próximo de tal ideologia e do pensamento de Sá Carneiro, adaptado aos novos tempos, apesar de todas as críticas que lhe possam ser feitas, é o PS.
É também necessário, nas próximas eleições autárquicas, infligir, a nível nacional, uma pessada derrota aos partidos do governo, para a mudança rumo a um país mais justo, fraterno, solidário e inclusivo.


Publicado no jornal "Gazeta da Beira", de 25/7/2013